Considerada uma das grandes damas do teatro brasileiro, Ruth de Souza nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 1928 e iniciou sua carreira artística no Teatro Experimental do Negro (TEN) em 1945.
Ruth encantou-se com a arte de interpretar ainda menina, quando sua mãe a levava para assistir as operetas, peças teatrais e aos filmes no cinema Americano, que posteriormente viria se chamar Cine Copacabana. Incentivada pela mãe, Ruth mergulhou no mundo mágico das telas de cinema e dos palcos. A admiração dos tempos de infância definiria seu objetivo de vida: interpretar.
Em 1945, uma reportagem que anunciava a seleção de elenco de um teatro negro chamou sua atenção. Ruth atendeu ao chamado de sua vocação e ingressou no TEN aos 17 anos e participou da estreia do TEN no Teatro Municipal do Rio de Janeiro no dia 8 de maio de 1945.
No TEN, Ruth de Souza atuou em várias peças do autor norte-americano Eugene O’Neill. Protagonizou uma memorável interpretação da Velha Nativa, único papel feminino na peça O imperador Jones, e fez também o papel de Hattie em Todos os filhos de Deus têm asas (Teatro Phênix, 1946). Atuou ainda em O moleque sonhador, apresentada como parte do Festival do 2º Aniversário do TEN realizado no ano de 1946, no Teatro Regina (mais tarde Teatro Dulcina).
Ruth de Souza realizaria seu primeiro trabalho como atriz profissional em 1947 quando o TEN uniu-se ao Teatro dos Comediantes para montar a peça Terras do Sem Fim, texto de Jorge Amado adaptado para o teatro e sob a direção de Zigmunt Turkov. Nessa peça Ruth interpretou Joana, personagem que ela faria novamente no ano seguinte em uma versão para o cinema.
Nesse mesmo ano já veio o reconhecimento pelo trabalho de atriz: Ruth recebeu o Prêmio Revelação pela sua interpretação da personagem Aíla em O filho pródigo, peça de Lúcio Cardoso dirigida por Abdias Nascimento. Outros papéis de Ruth no TEN foram os de Rosa Mulata e de Tia Zefa em Aruanda de Joaquim Ribeiro, e o de Lindalva em Filhos de Santo de José de Moraes Pinho, também sob a direção de Abdias Nascimento.
Abdias Nascimento relembra um dos mais destacados momentos da atuação teatral de Ruth de Souza no TEN:
Quando nós fomos comemorar o segundo aniversário do TEN, no Teatro Dulcina, nós montamos uma peça de Eugene O’Neill chamada O moleque sonhador. Tinha uma personagem que não se levantava da cama. Era Mammy Saunders, avó de Abe, o moleque sonhador do título da peça. Lá dentro das coxias do espetáculo estava assistindo o Procópio Ferreira, o grande ator e teatrólogo considerado o patrono do teatro moderno brasileiro. E ele ficou espantado e emocionado de ver que havia um talento capaz de fazer aquele papel aqui no Brasil. E esse talento foi o de Ruth de Souza. Orgulho nosso!
– Abdias Nascimento, em depoimento ao IPEAFRO, 2010
A estreia de Ruth de Souza no cinema aconteceu também em 1947, na antiga companhia Atlântida. Indicada por Jorge Amado, ela atuou no filme Terra violenta. Além desse, entre seus primeiros trabalhos no cinema estavam os filmes Falta alguém no manicômio e Também somos irmãos. Neste último ela trabalhou com Aguinaldo Camargo e Marina Gonçalves, ambos do TEN, e com Grande Otelo.
Para dar continuidade a sua formação, Ruth realizou um período de aperfeiçoamento nos Estados Unidos. Ela estagiou na Karamu House, em Cleveland, e visitou as universidades Harvard e Howard, bem como a Academia Nacional de Teatro Americano (ANTA), em Nova York. A experiência lhe possibilitou atuar no teatro amador americano como também permitiu desenvolver seu aprendizado em diversas atividades ligadas ao palco, tais como dramaturgia, iluminação, som e vestuário.
O trabalho de ator que vi em Karamu House, universidade norte-americana onde estudei, me convenceu de que não estávamos muito errados no TEN – e tínhamos trabalhado por intuição, de orelha.
– Ruth de Souza, entrevista à revista Dionysos (Ministério da Cultura), número especial sobre o TEN, n. 28, 1988.
De volta ao Brasil em 1953, Ruth retomou seus trabalhos no cinema e deu início à carreira na televisão. Ao lado de Haroldo Costa, Ruth participou do famoso teleteatro da TV Tupi em São Paulo e da adaptação da peça O filho pródigo, de Lúcio Cardoso, para a televisão. Anos depois ela assinou contrato com a TV Record, para participar de inúmeros seriados. Em 1965 fez sua estreia em telenovelas com A Deusa Vencida, de Ivani Ribeiro, na antiga TV Excelsior.
No cinema, participou do elenco de Sinhá Moça, de Tom Payne. O filme lhe conferiu projeção internacional, tendo sido indicada ao prêmio de melhor atriz coadjuvante no Festival de Veneza de 1954. Concorrendo com atrizes como Katherine Hepburn e Michele Morgan, Ruth de Souza perdeu por apenas dois pontos para Lili Palmer.
Durante a década de 1940, Ruth de Souza fez parte da companhia cinematográfica Atlântida e foi estrela da Vera Cruz durante as décadas de 1950 e 1960. Participou também de diversas produções como o filme Ângela, de 1951, do mesmo diretor Tom Payne, e o famoso O assalto ao trem pagador, produzido em 1962, de Roberto Farias. Este trabalho que lhe rendeu três vezes o prêmio Saci de melhor atriz coadjuvante.
Por seus inúmeros trabalhos no cinema, teatro e televisão, Ruth de Souza vem sendo agraciada com diversos prêmios e homenagens que reconhecem o seu talento e dedicação à arte da dramaturgia. Em comemoração aos seus 40 anos de carreira, o Centro de Integração da Cultura Afro-Brasileira (CICAB) homenageou a atriz em cerimônia realizada no Palácio do Planalto em 1985, com a participação do então Presidente José Sarney. Em 1989 ela recebeu do Ministério da Cultura o prêmio Dulcina de Moraes, na categoria teatro, por sua contribuição ao desenvolvimento da cultura brasileira.
O maior prêmio do cinema brasileiro veio em 2004. Juntamente com Léa Garcia, Ruth de Souza ganhou o Kikito de melhor atriz no Festival de Cinema de Gramado por sua atuação em Filhas do vento, filme dirigido por Joel Zito de Araújo.
Em 2010, Ruth de Souza foi agraciada pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro com o prêmio Almirante Negro João Cândido, ao lado de outras 16 personalidades que atuam em defesa dos direitos humanos da população afro-brasileira.
Teatro
1945 – O imperador Jones, de Eugene O´Neill
1946 – O moleque sonhador, de Eugene O´Neill
1946 – Todos os filhos de Deus têm asas, de Eugene O´Neill
1947 – Terras do sem fim, Jorge Amado
1947 – O filho pródigo, Lúcio Cardoso
1947 – Recital Castro Alves
1948 – A família e a festa na roça, Martins Pena
1948 – Aruanda, Joaquim Ribeiro
1949 – Filhos de Santo, José de Morais Pinho
1949 – Calígula, Albert Camus
1959 – Oração para uma Negra, de William Faulkner
1960 – Quarto de despejo, de Carolina de Jesus, adaptação de Edi Lima
1961 – Vereda da salvação, de Jorge Andrade
1964 – Vestido de noiva, de Nelson Rodrigues
Réquiem para uma negra, de William Faulkner
Televisão
2010 – Na forma da Lei – Velha Oxalá
2008 – Faça sua História – Passageira
2008 – Duas Caras- Tia Nena
2007 – Amazônia, de Galvez a Chico Mendes- Madrinha Entrevada
2006 – Sinhá Moça-Mãe Maria
2004 – Senhora do Destino- Marina (participação especial)
2002 – O Clone- Dona Mocinha
1996 – Quem É Você- Izulina
1994 – Memorial de Maria Moura- Siá Mena
1990 – Rainha da Sucata- juíza (participação especial)
1987 – Mandala- Zezé
1986 – Sinhá Moça – Balbina
1984 – Corpo a Corpo- Jurema
1980 – Olhai os lírios do campo-Mariana
1978 – Sinal de Alerta- Adelaide
1977 – Sinhazinha Flor- Justa
1976 – duas vidas- Elisa
1976 – O Grito- Albertina
1975 – Helena- Madalena
1975 – O Rebu- Lurdes
1974 – Os Ossos do Barão- Elisa
1973 – O Bem Amado- Chiquinha do Parto
1972 – Bicho do Mato- Zilda
1970 – Verão Vermelho- Clementina
1969 – A Cabana do Pai Tomás- Cloé
1968 – Passo dos Ventos
1965 – A Deusa Vencida– Narcisa
Cinema
2004 – Filhas do vento
2000 – Aleijadinho – Paixão, glória e suplício
1999 – Um copo de cólera
1994 – Boca
1991 – A grande arte
1987 – Jubiabá
1980 – O fruto do Amor
1977 – Ladrões de Cinema
1977 – Quem Matou Pacífico?
1975 – Ana, a Libertina
1974 – Pureza Proibida
1974 – Um homem célebre
1968 – O homem nu
1962 – O Cabeleira
1962 – O Assalto ao Trem Pagador
1962 – Favela
1961 – Bruma Seca
1960 – A morte comanda o cangaço
1959 – Macumba Love
1958 – Fronteiras do inferno
1958 – Ravina
1957 – Osso, amor e papagaios
1956 – Quem matou Anabela?
1954 – Candinho
1953 – Sinhá Moça
1951 – Terra é sempre terra
1951 – Ângela
1950 – Aglaia
1949 – Também somos irmãos
1948 – Falta alguém no manicômio
1948 – Terra violenta