Em 8 de maio de 1945, o Teatro Experimental do Negro (TEN) fazia história. Pela primeira vez, negros e negras pisaram no teatro como público e protagonistas de um espetáculo. O TEN marcou de forma indelével a história do teatro brasileiro ao promover a valorização da identidade negra na dimensão cultural, histórica, étnica e artística. O estudo e a reelaboração criativa dos valores da cultura de matriz africana no Brasil moldaram a atuação artística do TEN, que era sempre acompanhada do ativismo cívico pela democracia e os direitos humanos.
“Na rota dos propósitos revolucionários do Teatro Experimental do Negro vamos encontrar a introdução do herói negro com seu formidável potencial trágico e lírico nos palcos brasileiros e na literatura dramática do país.”
– Abdias Nascimento
Além de encenar peças de teatro com uma qualidade plástica e dramática muito elogiada pela crítica da época, o TEN incentivou a criação de uma dramaturgia de autoria negra e sobre temas da vida do povo de matriz africana.
Peças encenadas
O imperador Jones, de Eugene O’Neill
Todos os filhos de Deus têm asas, de Eugene O’Neill
Festival do II aniversário do TEN
O moleque sonhador, de Eugene O’Neill
Recital Castro Alves
Calígula, de Albert Camus
O filho pródigo, de Lúcio Cardoso
Ato Poético Cruz e Souza
Aruanda, de Joaquim Ribeiro
Filhos de santo, de José de Moraes Pinho
Rapsódia negra, de Abdias Nascimento
Onde está marcada a cruz, de Eugene O’Neill
Sortilégio (mistério negro), de Abdias Nascimento
O sapo e a estrela, de Hermilo Borba Filho
Atuação política do TEN
Em 1945, o TEN organizou a Convenção Nacional do Negro Brasileiro, que teve sua primeira reunião em São Paulo e a segunda em 1946 no Rio de Janeiro.
A Convenção Nacional do Negro Brasileiro lançou, em 1945, o Manifesto à Nação Brasileira, reivindicando que a nova Carta Magna explicitasse a origem étnica do povo brasileiro, definisse o racismo como crime de lesa-pátria e punisse a sua prática como crime.O Manifesto também demandou políticas positivas de igualdade racial, como bolsas de estudos e incentivos fiscais.
Vários partidos subscreveram o Manifesto, inclusive o PTB, a UDN, o PSD e o PCB de Luiz Carlos Prestes. Mas quando o senador Hamilton Nogueira apresentou o projeto, a Assembleia Nacional Constituinte de 1946 o rejeitou sob a alegação de inexistirem provas de discriminação racial no país. O TEN passou, então, a denunciar vários casos de discriminação, inclusive os da antropóloga Irene Diggs e da coreógrafa Katherine Dunham. A divulgação desses casos ajudou a criar as condições para a posterior promulgação de uma legislação fraca e ineficaz, conhecida como Lei Afonso Arinos.
Ciente da necessidade de ter parlamentares negros para defenderem no Congresso propostas que beneficiassem a população negra, o TEN incentivou e apoiou o lançamento de candidatos negros. Seu jornal Quilombo abriu espaço para candidatos negros de todos os partidos.
A atuação política do TEN manteve-se ao longo do tempo. Em 1966, por exemplo, ele lançou uma Declaração de Princípios em que se posicionou contra o colonialismo, reivindicando o mesmo posicionamento do governo brasileiro.
O 1º Congresso do Negro Brasileiro (1950)
O 1º Congresso do Negro Brasileiro se definiu como um evento de estudo e reflexão e, ainda, um acontecimento político de cunho popular, em contraste a outros certames como os Congressos Afro-Brasileiros de Recife (1934) e Salvador (1937), que tratavam o negro como um simples objeto de pesquisa.
Os intelectuais negros reunidos na Conferência preparatória ao 1º Congresso do Negro Brasileiro, em 1949, insistiam no princípio de políticas de igualdade racial que antes propuseram à Assembleia Constituinte de 1946. Nas palavras do escritor Fernando Góes:
“É tempo de todos olharem o negro como um ser humano, e não como simples curiosidade ou assunto para eruditas divagações científicas. Que se cuide da ciência, não é só louvável, como imprescindível. Mas que se assista ao desmoronamento e à degradação de uma raça, de braços cruzados, me parece um crime, e um crime tanto maior quando se sabe o que representou para a formação e o desenvolvimento econômico do nosso País.”
Os anais do 1º Congresso do Negro Brasileiro encontram-se publicados, parcialmente, no livro O negro revoltado, que Abdias Nascimento só conseguiu publicar em 1968.