Coluna Ipeafro no Pensar Africanamente saúda a nossa ancestralidade

Coluna IPEAFRO está de volta no canal Pensar Africanamente. Em pauta: um diálogo sobre o Nosso Sagrado, aquele onde a Tradição dos Orixás, praticada nas casas religiosas de matriz africana, exerce um papel para além do campo religioso atuando junto à sociedade civil na defesa da cidadania, das minorias, na luta antirracista e contra todas as formas de desigualdades. È dia 07 de março, às 19h30, ao vivo pelo canal YouTube ou pelo Facebook Pensar Africanamente. Link direto: https://www.youtube.com/watch?v=w1dvGZbAxqc.  Sorteio de dois exemplares do livro O Tradição dos Orixás, org. de Edlaine de Campos Gomes e Luis Cláudio de Oliveira. Ipeafro / Mar de Ideias, 2019.

Participantes:

Iya Sandrali Bueno
Iyalorixá, Psicóloga. Especialista em Criminologia. Servidora Publica. Ativista em Direitos Humanos. Antirracista. Feminista. Secretaria executiva do Conselho do Povo de Terreiro do Estado do Rio Grande do Sul. Coordenadora Estadual do GT Mulheres de Axé da Rede Nacional de Religiões Afro-brasileiras e Saúde (RENAFRO), Nucleo RS. Conselheira do Conselho Municipal do Povo de Terreiro de Pelotas. Coordenadora de Formação do Movimento Negro Unificado/ RS. Integra o Coletivo Político NegrAtividade e idealizadora do Coletivo Antirracista o Melhor de Cada Uma. Autora do livro Pelo direito de ser quem sou: um ser coletivo, Porto Alegre, RS: Zouk, 2022. 

Adaílton Moreira
Aos 56 anos é articulador da campanha #LutoNaLuta, contra o racismo e os crimes de racismo religioso / intolerância religiosa. Babá Adailton Moreira é Coordenador Nacional de Homens de Axé da RENAFRO-RJ. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (ProPED) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), tendo defendido em 2018 a dissertação “Infância nas Redes Educativas de Iemanjá no Ilê Omiojuarô”.  Recebeu a medalha de Mérito Pedro Ernesto da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, das mãos da vereadora Marielle Franco, em novembro de 2017. Em abril de 2018 recebeu o Prêmio Culturas Populares do MINC – Edição Leandro Gomes de Barros, in memoriam de sua mãe biológica, Mãe Beata de Yemonjá. Babá Adailton segue mantendo o legado de sua mãe à frente do espaço sagrado construído por Mãe Beata, a Comunidade de Terreiro Ilê Omiojuarô, localizada em Miguel Couto, Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, no estado do Rio de Janeiro.

Elisa Larkin Nascimento, autora do texto que abre o livro sorteado, é mestre em Direito e em Ciências Sociais pela Universidade do Estado de Nova York (EUA) e doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), e foi parceira de Abdias Nascimento durante os últimos 38 anos de sua vida. Juntos fundaram, em 1981, o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Elisa conceituou o fórum Educação Afirmativa Sankofa e escreveu diversos livros, entre eles O Sortilégio da Cor; os quatro volumes da coleção Sankofa; Adinkra, Sabedoria em Símbolos Africanos e Abdias Nascimento, A Luta na Política. É curadora do Museu de Arte Negra online e participa da curadoria da exposição Abdias Nascimento e Museu de Arte Negra, realizada em parceria do Ipeafro com o Inhotim (2021-23). 

Performance de Milsoul Santos. Autor dos livros Pássaro preto e Amor sem miséria, milita politicamente através da arte.

Sorteio: Para participar do sorteio você precisa ter uma conta no Instagram. Até às 21h do dia do sorteio, você vai fazer o seguinte:

(1) Compartilhe este evento no seu Stories, mencione e siga: @ipeafro @pensar.africanamente 

(2) Faça um comentário e marque dois amigos

ATENÇÃO: não é permitido marcar contas fakes. Lembre-se: O prazo é até as 21h do dia do evento. Boa sorte!!!

10ª Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti (FLIDAM)

Está fechada a programação do 10ª Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti (FLIDAM), a ser realizada de 16 a 20 de novembro no Instituto Federal do Rio de Janeiro, campus São João de Meriti ( Rua Vala da Divisa, s/n, Coelho da Rocha, São João de Meriti, CEP: 25550-110).  A entrada é gratuita. Acesse a programação completa e faça a sua inscrição agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10.
 
Com a palavra o curador do evento: “nesta edição de aniversário do festival, a primeira após a pandemia de Covid-19, que assolou a humanidade obrigando aos organizadores a buscar novas estratégias para a realização do Festival, a comissão organizadora aceitou os desafios e buscou abertura para novos caminhos, para a realização do FLIDAM ampliando seus meios de atuação. Em 2022, com a primeira edição presencial, ficou claro que ações voltadas ao território não apenas continuam possíveis durante a pandemia, como são profundamente necessárias. Este ano voltando a marcar presença no território, em especial, chamando a comunidade negra a refletir os ataques sofridos no campo da cultura: na secretaria especial de cultura, pós desmantelamento do ministério, com reflexo na Fundação Palmares que todos conhecem o desfecho. Neste sentido como convite a reflexão a situação atual do país o tema do festival é pela ampliação da política de cotas raciais em universidades e institutos brasileiros”.
Abaixo, alguns destaques da programação:
 
 
A Yawo da Oxum, psicanalista em formação, pedagoga do IFRJ, instituição onde também atua como docente, pesquisadora e orientadora nos cursos de pós-graduação. Atualmente é Diretora de Ensino do IFRJ campus São João de Meriti. É Doutora em Políticas Públicas e Formação Humana pela UERJ. Desenvolve pesquisa sobre epistemologias alternativas, produção de conhecimento e circulação de saberes com ênfase no pensamento Feminista Negro, Terreiro, Ancestralidade, Encantamento e mãe da Dandara e do João, Luana Luna, será homenageada com o Prêmio Orgulho da Diáspora Africana – Diáspora na 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
O cineasta, doutor e mestre em educação, educador audiovisual e ambiental, pesquisador do GEASur, fundador do CAN – Cineclube Atlântico Negro e do CineGEASur, Clementino Junior, apresentará e debaterá seu curta Romão no Flidamcine, que exibe filmes, curtas e documentários que abordam a cultura afro-brasileira e a diáspora, nesta 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
 
 
 
A Vice-Cônsul do Consulado Geral de Angola no Rio de Janeiro, Srª Madalena Filipi Vusawekumbi, comporá a mesa de abertura da 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
 
 
 
 
 
O rapper, compositor e produtor premiado, influenciador e agitador cultural de destaque na região da Baixada Fluminense, Marcão Baixada, será homenageado com o Prêmio Orgulho da Diáspora Africana – Literatura na 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A Dirigente Sindical do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação SEPE São João de Meriti, Juliana Drumond, será homenageada com o Prêmio Orgulho da Diáspora Africana – Educador(a) na 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
 
 
 
 
 
O Professor e orientador no PPGHC/UFRJ, em 2001, recebeu o Prêmio Cidadania Mundial, dado pela UNESCO, A frente do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas, Como interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) e em parceria com o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP), o sacerdote realiza anualmente, no terceiro domingo do mês de setembro, a Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, Pós-Doutor Babalawô Ivanir dos Santos, será homenageado com o Prêmio Orgulho da Diáspora Africana – Diáspora na 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10
 
 
A Professora de Psicologia do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) e do Departamento de Direitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (DIHS/ENSP/FIOCRUZ), é Pesquisadora-Líder do ODARA – Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Cultura, Identidade e Diversidade (CNPq/IFRJ). Coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas – NEABI do IFRJ Campus Belford Roxo. Presidenta da ABETH – Associação Brasileira de Estudos da Trans-Homocultura. Autora de centenas de publicações, entre elas os livros “Transfeminismo: Teorias e Práticas”, “Homofobia: Identificar e Prevenir”, “Ainda que Tardia: Escravidão e Liberdade no Brasil Contemporâneo”, “Como Eu Não Dancei” e “Eu Não Sou Uma Mulher? E outros Discursos de Sojourner Truth”, entre outros. Foi Visiting Scholar da Duke University (Carolina do Norte/EUA), com a qual desenvolve pesquisa sobre saúde mental de minorias sexuais e de gênero em seis países. Foi a primeira gestora do Sistema de Cotas para Negras e Negros da UnB, tendo ocupado o cargo de Assessora de Diversidade e Apoio aos Cotistas e Coordenadora do Centro de Convivência Negra da UnB, Jaqueline Gomes de Jesus, será homenageada com o Prêmio Orgulho da Diáspora Africana – Educador(a) na 10ª edição do Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti. Inscreva-se agora mesmo em: https://doity.com.br/flidam10

Salve Emanoel Araújo! Escultor, artista plástico e criador do Museu Afro Brasil

Imagem: reprodução do Instagram

Há sete dias, em 7 de setembro de 2022, o Brasil perdia um de seus mais importantes pensadores da arte: Emanoel Araújo. Escultor, artista plástico e curador , “Emanoel Araújo sempre foi um patriota que elevou e divulgou o Brasil e a cultura do nosso país” informa a nota publicada pelo Museu Afro Brasil, organização sediada em São Paulo, fundada pelo artista. Baiano de Santo Amaro da Purificação, Emanoel Araújo nasceu em 1940. 

Filho de uma família tradicional de ourives – um metalúrgico especializado em trabalhar ouro e outros metais preciosos –  aprendeu marcenaria e estudou composição gráfica na Imprensa Oficial de sua terra natal. Em 1960 mudou-se para Salvador ingressando na Escola de Belas Artes da Bahia (UFBA), onde especializou-se no estudo da gravura. Em 1966 recebeu o primeiro prêmio nacional em reconhecimento a sua obra, por sua participação na II Exposição Jovem Gravura Nacional no Museu de Arte Contemporânea de São Paulo.

Sua carreira foi permeada por honrarias: medalha de ouro na 3ª Bienal Gráfica de  Florença, Itália (1972); melhor gravador (1972) e melhor escultor (1973) segundo a Associação Paulista de Críticos de  Arte (APCA); prêmio “Cicillo  Matarazzo”  pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA) (1998 e 2007); prêmio Clarival do Prado Valladares e Medalha Zumbi dos Palmares pela Câmara Municipal de Salvador (2020); e medalha Tarsila do Amaral pelo Governo do Estado de São Paulo (2021). Teve cerca de 50 exposições individuais organizadas e participou de mais de 150 mostras coletivas em galerias e museus ao redor do mundo.

Emanoel Araújo, Mulher com frutas na cabeça,1966. Coleção Abdias Nascimento | Museu de Arte Negra | IPEAFRO

Uma dessas exposições onde é possível observar de perto o trabalho de Araújo está em andamento até 2023 no Inhotim, numa parceria do IPEAFRO com o museu localizado em Brumadinho, Minas Gerais. O trabalho de Emanoel Araújo em xilogravura, Mulher com frutas na cabeça (foto), de 1966, integrante da coleção Abdias Nascimento | Museu de Arte Negra | IPEAFRO se junta a dezenas de outros trabalhos artísticos e a uma centena de documentos e fotos para homenagear o legado de outro pensador destacado das artes no Brasil: Abdias Nascimento e o seu projeto de museu, o Museu de Arte Negra, fundado em 1950 e que se tornou uma referência para toda uma geração. 

De alguma forma, o Museu Afro Brasil, em São Paulo, instituição que reúne um acervo de mais de 6 mil obras, entre pinturas, gravuras, esculturas, fotografias e documentos, que revelam a importante contribuição das pessoas negras para a formação cultural do país, é fruto dos esforços pioneiros do projeto Museu de Arte Negra. À frente do Museu Afro Brasil, entre outras realizações, Emanoel Araújo levou adiante uma tradição de construção museológica que priorizou o saber de matrizes afrodiaspóricas com  exposições destacadas que já fazem parte da história da arte no Brasil.

Entre elas, a exposição “África Africans”, que recebeu o prêmio de melhor exposição de 2015 pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA). Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, exibido no dia 18 de dezembro de 2017, Emanoel contou um pouco de sua trajetória pessoal e profissional e apresentou a missão institucional do Museu Afro Brasil: tratar “o afrodescendente, africano e negros na 1° pessoa. O museu foi todo pensado na arte, na história e na memória”.  Araújo nos representa! Salve o mestre!

A entrevista na íntegra pode ser assistida abaixo.

Fonte: Museu Afro Brasil e TV Cultura
Foto: Secretaria da Cultura de São Paulo / Reprodução

14 de março 2022: Ocupação Abdias Nascimento na Kaza 123(RJ) celebra legado de Carolina, Abdias e Marielle

Carolina, Abdias e Marielle: Vida, Ancestralidade e Continuação

O 14 de março carrega importante simbolismo à luta Negra no Brasil não é de hoje. Nessa data, em 1914, nasceram a escritora Carolina Maria de Jesus e o ativista Abdias Nascimento; em 2018, morreram a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, brutalmente assassinados em crime ainda não desvendado. Quem mandou matar Marielle? Por lei estadual no Rio de Janeiro, o dia 14 de março é Dia do Ativista pelo aniversário de Abdias, e Dia Marielle Franco de Luta contra o Genocídio das Mulheres Negras. 

Como parte da agenda coletiva 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo, a Kaza 123 e o IPEAFRO – Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros realizam a Ocupação Abdias Nascimento na KAZA 123. O evento tem o propósito de preservar a memória de Carolina, Abdias e Marielle, além de celebrar a vida, a ancestralidade e a continuação do legado deles, que reverbera e traz esperança atualmente na luta pela valorização da cultura negro-africana e contra o genocídio do povo negro. A atividade terá o formato híbrido, com atividades presenciais e transmissão ao vivo pelo canal do IPEAFRO no Youtube, retransmitida pelo canal coletivo 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo

Ocupação Abdias Nascimento na KAZA 123
Realização: IPEAFRO, Kaza 123 e 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo
Data: 14 de março de 2022
Horário: 17h
Local (presencial): Rua Visconde de Abaeté, 123, Vila Isabel, Rio de Janeiro
Local (remoto): Youtube IPEAFRO e 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo https://www.youtube.com/c/IPEAFRO/featured / https://www.youtube.com/c/21DiasAtivismoContraoRacismo 
Entrada: gratuita

A Ocupação será realizada em formato de sarau cultural e trará diversos convidados para a celebração. A atriz e jornalista Lica Oliveira apoia  a produção e será  a mestre de cerimônia. Na ocasião, será lançado o livro Abdias Nascimento, a luta na política, de Elisa Larkin Nascimento, publicação da Editora Perspectiva. A autora, que é fundadora do IPEAFRO e viúva de Abdias Nascimento, participará, virtualmente, de um bate papo com o público mediado por Lica Oliveira, com início às 17h.

Em seguida, leituras dramatizadas de poemas e textos de Abdias Nascimento e Carolina Maria de Jesus serão interpretadas pelos atores Deo Garcez, Thiago Justino e Cida Moreno. Serão exibidos vídeos produzidos com base no acervo IPEAFRO, ressaltando trabalhos de Abdias ligados ao Museu de Arte Negra (1950) e Teatro Experimental do Negro (1944). Além disso, haverá, também, homenagem à memória de Marielle Franco.  O artista plástico Vander Gomes executará pinturas em tempo real e apresentações musicais dos artistas Anselmo Pianista e Mombaça embalam o evento. O roteiro e a direção artística da Ocupação Abdias Nascimento na KAZA 123 tem a assinatura de Ângelo Flávio, diretor, ator e dramaturgo baiano.

DECLARAÇÕES
“A Kaza123, orgulhosamente, aceitou o convite do IPEAFRO para ser morada de grandes personalidades da história do nosso país. Celebrar Abdias, Carolina e Marielle em uma data tão significativa, e dentro de uma ação tão importante como a “21 Dias de Ativismo Contra o Racismo”, nos enche de orgulho e gratidão. Jogar luz sobre narrativas negras e enfatizar o protagonismo negro em grandes feitos é a nossa missão. Neste 14 de março de 2022, sejam muito bem-vindos, bem-vindas e bem-vindes à Ocupação Abdias na Kaza123”, afirma  Lica Oliveira, uma das fundadoras da Kaza 123 junto à designer gráfica e chef da Angurmê, Maria Júlia Ferreira.

“A Campanha foi elaborada em 2016, teve muita adesão e virou uma campanha coletiva. A primeira edição foi em 2017. Em 2018, a Marielle Franco fez uma atividade na Casa das Pretas e, ao deixar o lugar, foi executada a caminho de casa, no bairro do Estácio, no Rio de Janeiro. Desde 2019, colocamos na agenda o dia 14 de março em homenagem à Marielle Franco. Depois, com a informação do IPEAFRO sobre Abdias Nascimento e Carolina de Jesus, acrescentamos essa justa homenagem a esses ícones da Cultura Negra”, afirma Luciene Lacerda, psicóloga, criadora e articuladora da agenda coletiva 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo”, afirma Luciene Lacerda, psicóloga, criadora e articuladora da agenda coletiva 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo.

“No 14 de março de 2018, o IPEAFRO estava na UFBA em uma mesa de debates em torno do lançamento da nova edição do livro O Genocídio do Negro Brasileiro, de Abdias Nascimento. Tivemos parceiros como o Coletivo Luíza Bairros da UFBA, o Sarau da Onça e o Quilombo Rio dos Macacos. Observamos ali a coincidência dos nascimentos de Abdias e Carolina Maria de Jesus, e no final do dia, recebemos a notícia do brutal assassinato da vereadora da Marielle Franco no Rio de Janeiro. O impacto pesado desse fato nos fez pensar sobre o fluxo trágico e vitorioso das gerações do povo preto. Massacradas pelo sistema, ainda assim seguem construindo e reconstruindo a vida em liberdade: o quilombismo, no conceito do professor Abdias Nascimento. Desde então, o IPEAFRO rememora esse ciclo no dia 14 de março para celebrar a luta e o legado que liga essas sementes”, afirma Elisa Larkin Nascimento, diretora do IPEAFRO.

SEMENTES

Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977)
Escritora mineira, nascida em Sacramento (MG) em 14 de março de 1914, mesma data e região geográfica em que nasceu Abdias Nascimento. Sofreu um episódio de racismo violento em sua cidade, quando foi acusada injustamente de roubo. Foi presa e espancada continuamente até que, por outros meios, o dinheiro aparecesse. Inocentada, mudou-se para São Paulo, onde chegou caminhando a pé. Morou na favela do Canindé, às margens da marginal do Tietê. Teve três filhos. Cuidou deles só. A fome fazia parte do cotidiano da família. Eis a inspiração dramática para seus escritos. Catando papéis, ela tirava o mínimo  sustento da família. Desses papéis também tirava pedaços de folha onde escrevia suas memórias, textos, poesias e sonhos. Um dia, o jornalista Audálio Dantas foi fazer uma matéria para a Folha de São Paulo sobre a vida na favela. Encontrou-se com Carolina Maria de Jesus, soube de sua história, leu seus textos, ficou admirado. Publicou a história de Carolina no jornal. Dois anos mais tarde, em 1960, o jornalista reuniu os textos de Carolina em Quarto do Despejo, livro que virou best-seller. Vendeu 3 milhões de livros no Brasil e 4 milhões em 15 países do exterior. É a escritora brasileira mais publicada no mundo. Carolina não deixava ninguém falar por ela. Morreu no ostracismo em 1977.

Abdias Nascimento (1914 – 2011)
Político, escritor, jornalista, teatrólogo, professor. Nasceu em Franca (SP). Fundou o Teatro Experimental do Negro, em que pessoas negras pisaram nos palcos do Teatro Municipal e outros do Rio de Janeiro pela primeira vez. Dirigindo, atuando e produzindo uma peça em que o papel principal foi feito por um ator negro. Abdias Nascimento foi o principal organizador do primeiro Congresso do Negro Brasileiro. Fundou o jornal Quilombo. Atuou como curador do projeto do Museu de Arte Negra. Foi perseguido politicamente e preso diversas vezes por resistir ao racismo. Viveu 13 anos em exílio durante a ditadura militar no Brasil. Voltou ao país e foi o primeiro parlamentar negro da Câmara dos Deputados. Fundou o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Participou da construção e promulgação da Constituição Cidadã em 1988. Defensor da democracia e dos direitos humanos das populações negras, foi oficialmente indicado ao Nobel da Paz. Autor de “O Genocídio do Negro Brasileiro”e “O Quilombismo”, clássicos do pensamento social brasileiro, ele atuou ainda como secretário de Estado e Senador da República. 

Marielle Franco (1979 – 2018)
Marielle Franco foi uma política brasileira. Formada em Sociologia (pela PUC-Rio) e com Mestrado em Administração Pública (pela UFF). Eleita Vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) no ano de 2016, com 46.502 votos. Enfrentou as milícias sem medo. Denunciou policiais corruptos. Defensora dos direitos humanos, coordenou, junto com Marcelo Freixo, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Ao longo do período em que atuou como vereadora apresentou 16 projetos de lei, especialmente pensados em políticas públicas para negros, mulheres e LGBTI. Mãe, mulher negra de favela, mãe, lésbica. Foi assassinada ao lado de seu motorista Anderson Gomes em um 14 de março, em crime ainda não desvendado. O caso talvez seja o mais relevante atualmente para se compreender o contexto da política nacional e de como funcionam os mecanismos de racismo no Brasil. 

SOBRE IPEAFRO
Há 40 anos o IPEAFRO vem se dedicando a preservar e difundir o acervo museológico e documental de Abdias Nascimento e das organizações que ele fundou ao longo de 97 anos de vida: Teatro Experimental do Negro (TEN), em 1944, jornal Quilombo, em 1948, Museu de Arte Negra (MAN), em 1950, além do próprio IPEAFRO, em 1981. Nossa missão é desenvolver, a partir do conteúdo desse acervo, ações de caráter educativo centradas no conhecimento e na valorização da história e cultura africanas e afro-brasileiras; combater o racismo no mundo.

SOBRE KAZA 123
A Kaza123 é um espaço acolhedor, como toda casa deve ser. Aqui respiramos o melhor cheirinho e saboreamos o melhor tempero do Angurmê Culinária, trocamos saberes inspirados nos melhores títulos da Livraria Kitabu, e mergulhamos na arte, na cultura, na moda e na beleza, com a Complexo B, Andrea Brasis e Espaço L.O. Situada no coração do bairro de Vila Isabel, na Zona Norte da capital fluminense, no Rio de Janeiro. 

SOBRE 21 DIAS DE ATIVISMO CONTRA O RACISMO
A campanha 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo! parte de referência histórica: em 21 de março de 1960, o apartheid, regime racista na África do Sul, assassinou 69 jovens e feriu outros 186 em uma brutal repressão do Estado frente a uma manifestação pacífica, organizada pelos negro-africanos. O episódio ficou conhecido como o “Massacre de Shaperville”. Apesar desse episódio, o regime de segregação racial adotado na África do Sul durou até 1994, em um total de 46 anos de leis racistas vigentes naquel país. A eleição de Nelson Mandela, que passou 27 anos como preso político, naquele 1994 entraria para história. A ONU – Organização das Nações Unidas – considera a data do Massacre de Shapperville o Dia Internacional Pela Eliminação da Discriminação Racial. No Brasil a realidade não é diferente. Estatisticamente, um jovem negro é morto a cada 23 minutos. A campanha 21 DIAS DE ATIVISMO CONTRA O RACISMO! caminha em direção a promoção de atividades construídas de forma autônoma, com ações e discussões que mantêm vivas as conquistas recentes, além de  ampliar as discussões do que ainda é necessário avançar para a verdadeira libertação das populações negras no mundo. Durante 21 dias, em março, atividades organizadas por ativistas antirracistas no Brasil e no exterior discutem e apresentam soluções para a luta antiracista.

SERVIÇO

Ocupação Abdias Nascimento na KASA 123
Realização: IPEAFRO, Kasa 123 e 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo
Data: 14 de março de 2022
Horário: 17h
Local (presencial): Rua Visconde de Abaeté, 123, Vila Isabel, Rio de Janeiro
Local (remoto): Youtube IPEAFRO e 21 Dias de Ativismo Contra o Racismo https://www.youtube.com/c/IPEAFRO/featured / https://www.youtube.com/c/21DiasAtivismoContraoRacismo 
Entrada: gratuita

 

Abdias Nascimento no MASP: mais que uma exposição (2022)

Abdias Nascimento (1914-2011) pintou Okê Oxóssi (1970) quando se encontrava havia dois anos no exílio da ditadura militar. O trabalho ressignifica a bandeira nacional, então sequestrada por conservadores e militares. Na faixa da frase “ordem e progresso” o artista escreveu “okê”, palavra de saudação a Oxóssi, orixá da caça e da cura pelas ervas. Abdias Nascimento introduziu o arco e a flecha do caçador em mémória da luta dos negros e negras e dos povos orginários no Brasil. Para além da parte estética, a vida e obra de Nascimento configuram-se como um meio de luta política em defesa da democracia e dos direitos humanos. 

Em 2022, essa tela continua atualíssima. Os conservadores, com apoio dos militares, mais uma vez sequestraram a bandeira nacional, avançando sobre o país um retrocesso sem precedentes desde a constituinte de 1988. O risco à democracia e aos direitos humanos são duras realidades. As estatísticas não deixam dúvidas do tamanho do desafio: um jovem negro é morto a cada 23 minutos (relatório final da CPI do Senado sobre o Assassinato de Jovens, 2016); quase 20 milhões de brasileiros não têm o que comer (Rede PENSSAN, 2021).

O IPEAFRO – Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiro, fundado por Abdias Nascimento e que guarda o seu legado, colabora com o MASP – Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand na exposição Abdias Nascimento, um artista panamefricano. A mostra ocupa os espaços da galeria e do mezanino, no 1o subsolo do museu. Com curadoria de Amanda Carneiro e Tomás Toledo, a mostra foca a faceta artística de Abdias Nascimento e sua vida de intelectual, ativista político, dramaturgo, ator, escritor e diretor. A exposição tem patrocínio do escritório Mattos Filho. 

Reunindo 62 pinturas — realizadas desde quando começou a pintar em 1968 até o ano de 1998 —, a mostra enfatiza o repertório de ideias, cores e formas do movimento pan-africanista, com noções, fontes e imaginário amefricano. O título parte desse termo cunhado por Lélia Gonzalez (1935-1994), companheira de luta, interlocutora política e intelectual do artista, que formulou o conceito para se referir à experiência negra e dos povos originários na América Latina. A mostra retoma conceitos formulados por Nascimento, como o quilombismo, para destacar o projeto de erguer a transformação social sobre bases que retomam a experiência dos quilombos e a história dos povos escravizados nas Américas. 

PINTOR AOS 54 ANOS 

Em 1968, ano que marca o início de sua pintura e sua partida para os Estados Unidos, Abdias Nascimento já era um nome laureado no Brasil. Participou da Frente Negra Brasileira, movimento e depois partido político criado na década de 1930, e da fundação do Teatro Experimental do Negro, o TEN, uma das mais radicais experiências de dramaturgia do país, nos anos 1940; realizou o concurso Cristo de cor, que contou com diversos artistas, como por exemplo Djanira (1914-1979), para representar um Jesus negro, em 1955; e na mesma década idealizou o Museu de Arte Negra, cujo acervo é referência nos debates sobre museus e comunidades. 

Já seus trabalhos de artes visuais foram mais celebrados em solo estadunidense, onde realizou exposições no conceituado Studio Museum em Harlem, Nova York; Langston Hughes Center, em Buffalo; Malcolm X House, Universidade Wesleyan; Inner City Cultural Center, Los Angeles; Crypt Gallery, Universidade de Columbia. Parte das pinturas desta mostra apresenta ao público o trabalho de Nascimento com símbolos e bandeiras de projetos e identidades nacionais, ao lê-los a partir de uma perspectiva panafricanista e amefricanista. Os trabalhos Okê Oxóssi e Xangô sobre, ambos de 1970, por exemplo, estabelecem paralelos entre representações do Brasil e dos Estados Unidos por meio de uma recomposição de símbolos nacionais: os elementos de suas bandeiras. 

Segundo Amanda Carneiro, curadora da exposição, “… ao subverter o sentido das bandeiras, incorporando referências de matriz africana, questionam-se medidas de incorporação (ou seria retomada?) de signos culturais mais plurais, não exclusivamente alicerçados no eurocentrismo, repensando as comunidades imaginadas”. Okê Oxóssi pode ser considerada um ponto de partida para a mostra individual de Abdias Nascimento no MASP. A pintura — doada ao acervo do museu no âmbito da mostra Histórias Afro-Atlânticas (2018) por Elisa Larkin Nascimento, cofundadora e atual presidente do Ipeafro — ganha agora novos significados no contexto expositivo dedicado a histórias brasileiras, em conjunção com a extensa produção do artista. 

CATÁLOGO 
Acompanhando a mostra, será publicado um catálogo com imagens das mais fundamentais obras do artista, incluindo todas as exibidas no museu. Organizado por Adriano Pedrosa e Amanda Carneiro, o volume contém ensaios inéditos de Amanda Carneiro, Glaucea Helena de Britto, Kimberly Cleveland, Raphael Fonseca e Tulio Custódio e uma entrevista histórica com Elisa Larkin Nascimento conduzida por Tomás Toledo, além de republicar textos de Lélia Gonzalez e de Abdias Nascimento. Com design do estúdio Bloco Gráfico, será publicado em capa dura e em um único volume bilíngue, em inglês e português, a R$ 149. O catálogo será vendido com 20% de desconto no MASP Loja, online ou física, cumulativo com o desconto do programa Amigo MASP. 

(texto produzido com base no release do MASP e conteúdo do IPEAFRO)

SERVIÇO 

Abdias Nascimento, um artista pan-amefricano 
Curadoria: Amanda Carneiro, curadora assistente, Tomás Toledo, curador-chefe 
Visitação: de 25 de fevereiro até 05 de junho de 2022 
Local: 1o subsolo (galeria e mezanino) 
MASP — Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand 
Avenida Paulista, 1578 – Bela Vista 01310-200 São Paulo, SP
Telefone: (11) 3149-5959
Horários: terça grátis Qualicorp, das 10h às 20h (entrada até as 19h); quarta a domingo, das 10h às 18h (entrada até as 17h); fechado às segundas Agendamento online obrigatório pelo link masp.org.br/ingressos 
Ingressos: R$ 50 (entrada); R$ 25 (meia-entrada) www.masp.org.br facebook.com/maspmuseu twitter.com/maspmuseu instagram.com/masp 

ASSESSORIA DE IMPRENSA
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Abdias Nascimento e MAN no Inhotim (2021 – 2023) – 1° ato

Poeta, escritor, dramaturgo, curador, artista plástico, professor universitário, pan-africanista e parlamentar, Abdias Nascimento (1914-2011), indicado oficialmente ao prêmio Nobel da Paz em 2010, teve uma longa trajetória trilhada no ativismo e na luta contra o racismo. Em 2021, ano que marca os dez anos da perda desse intelectual essencial para o pensamento brasileiro, Inhotim e IPEAFRO (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros), instituição fundada por Abdias e que zela pelo seu legado, o homenageiam com uma ação de longa duração, a ser realizada entre 4 de dezembro de 2021 até dezembro de 2023.
 
De forma inédita, Inhotim sedia outro museu dentro de seu espaço e, em parceria com IPEAFRO, traz ao público o Museu de Arte Negra (MAN), projeto idealizado pelo Teatro Experimental do Negro sob a liderança de Abdias Nascimento no início dos anos 1950. Pensado para ser um “museu voltado para o futuro”, o MAN nasceu com o objetivo de “recolher e divulgar a obra de artistas negros, sem distinção de gênero, escola ou tendência estética, promovendo-se, assim, a documentação de sua criatividade, estimulando sua imaginação e invenção na ampla faixa de expressão plástica”, como bem explicou Abdias Nascimento em entrevista para o extinto Correio da Manhã (1968, acervo IPEAFRO).
 
A iniciativa traduz o desejo de Abdias Nascimento de desafiar os conceitos vigentes sobre a arte moderna, revelando sua relação com a estética africana. Além disso, procura apoiar e promover a produção de artistas negros de todo o mundo e enfrentar o racismo em suas dimensões estética e institucional.
 
A exposição será dividida em quatro atos, cada um com duração de cerca de cinco meses, desdobrados a partir de indagações postas à coleção do Museu de Arte Negra. O primeiro, exibido a partir de 4 de dezembro, traz o diálogo entre a obra de Abdias, Tunga e o acervo do MAN em um espaço que remete às origens do Inhotim: a Galeria Mata, situada próximo à Galeria True Rouge, uma das primeiras da instituição e que expõe de forma permanente a instalação de título homônimo de Tunga. 

Primeiro ato – “Tunga, Abdias Nascimento e o Museu de Arte Negra” 

Em entrevista para o jornal Correio da Manhã, em 1968, Tunga, então com 15 anos, afirmava que a arte negra exercia grande influência em sua obra. “Para mim, a arte negra foi a primeira a romper os grilhões das saturadas imagens renascentistas”, disse o jovem que, na época, já doava trabalhos à coleção Museu de Arte Negra.  

Tunga, um dos artistas mais emblemáticos da coleção do Inhotim, cresceu convivendo com Abdias. Ele era filho de Gerardo Mello Mourão, poeta que, na década de 1930, fez parte da Santa Hermandad Orquídea ao lado de Abdias Nascimento e outros escritores. O grupo funcionava como uma espécie de aliança poética que buscava a construção de uma poesia verdadeiramente americana e foi campo fértil para a amizade duradoura entre as famílias de Abdias e Gerardo. Foi Gerardo, inclusive, que indicou Abdias Nascimento pela primeira vez ao prêmio Nobel da Paz, em 1978. Abdias seria indicado novamente, em 2004, pela sociedade civil e autoridades brasileiras. A indicação oficial veio em 2009.    

Foto: Tunga (de frente) e o filho de Abdias Nascimento, Bida, experimentando arte. Na imagem também é possível identificar a pintura de Tunga guardada por mais de 50 por Abdias Nascimento que fez parte da coleção MAN. Nota: o texto da reportagem que acompanha a foto, se referea Tunga como “Dunga”. Correio da Manhã, 1968. Acervo IPEAFRO 

A curadoria feita a quatro mãos – Inhotim e IPEAFRO – reuniu para este primeiro ato pinturas, desenhos, fotografias e instalações que evidenciam o diálogo e a conexão artística entre Tunga e Abdias. 

Entre as obras apresentadas estão o quadro pintado por Tunga em 1967, aos 15 anos, para o acervo do MAN; Invocação Noturna ao Poeta Gerardo Mello Mourão: Oxóssi (1972), pintura que Abdias fez em homenagem ao amigo Gerardo e à memória dos poetas da Santa Hermandad Orquídea; e a instalação Toro Condensed; Toro Expanded (1983 – 2012), na qual Tunga traz a ideia de movimento contínuo e alude a metáforas de desenvolvimento, como o ciclo da vida, que faz parte da mitologia afro-brasileira.  

“Amigos de longa data, Tunga e Abdias abrem espaço para o Museu de Arte Negra, e para os próximos atos desse projeto. Cosmogonias, tradição e ancestralidade conduzem os caminhos neste encontro de mundos”, diz Douglas de Freitas, curador do Inhotim.      

Museu de Arte Negra

Desde os anos 1940, Abdias Nascimento e seus companheiros lançavam as bases para a fundação do Museu de Arte Negra (MAN) a partir do Teatro Experimental do Negro (TEN). Com a proposta de valorização social do negro e da cultura afro-brasileira por meio da arte e da educação, o TEN buscava delinear um novo estilo estético e dramatúrgico.  

Foi o TEN que, em 1950, no Rio de Janeiro, organizou o 1º Congresso do Negro Brasileiro, em que se discutiu a “estética da negritude” e modos de visibilização e valorização da produção de artistas negros e daqueles que lidavam com a representação da cultura negra em seus trabalhos. Nesse sentido, a plenária do Congresso aprovou uma resolução sobre a necessidade de um museu de arte negra. O TEN assumiu o projeto, e assim nasceu o MAN. 

“Naquela altura, ainda influenciada pela primeira onda modernista, que reafirmava o mito dos ‘benefícios da miscigenação’ das três raças (branca, indígena e negra) para a formação da sociedade brasileira, a representação do negro nos museus tradicionais aparecia em segundo plano e, em sua maioria, mediada pelo olhar do branco. Assim, era preciso romper com esse sistema representacional e tornar visível ao mundo a riqueza da cultura negra para o campo da Arte”, explica Deri Andrade, curador assistente do Inhotim e pesquisador à frente do Projeto Afro – plataforma afro-brasileira de mapeamento e difusão de artistas negros.  

A coleção Museu de Arte Negra ganhou forma sendo composta por pinturas, desenhos, gravuras, fotografias, esculturas, dentre outras, numa pluralidade de suportes e técnicas. “Da curadoria dessa coleção e da convivência com o artista Sebastião Januário em um pequeno apartamento no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, surgiu a ‘aventura pictórica’ de Abdias Nascimento (assim ele se referiu à sua própria produção artística)”, afirma Julio Menezes Silva, coordenador do projeto Museu de Arte Negra do IPEAFRO no ambiente virtual. 

Em 1955, o projeto MAN promoveu um concurso de artes plásticas e uma exposição sobre o tema do Cristo Negro. A exposição inaugural da coleção Museu de Arte Negra foi realizada em 6 de maio de 1968, no Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro. Os organizadores aproveitaram, para isso, a comemoração dos 80 anos da abolição da escravatura, ocorrida em 1888. Entretanto, eles tinham plena consciência de que as estruturas que sustentavam o regime escravista de violação de direitos e da dignidade humana se mantinham sob a forma do racismo. Sem medidas reparatórias como acesso ao emprego, à cultura e à educação, a abolição resultou na exclusão social, econômica, política e cultural da população negra recém-libertada.  

De modo a contestar essas ausências, a criação do TEN e do MAN por Abdias Nascimento foi uma forma de dar visibilidade à cultura negra e sua importância para a formação nacional. Após a abertura da exposição, Abdias Nascimento ganhou uma bolsa de intercâmbio cultural para os Estados Unidos. Era a fase mais dura da ditadura civil-militar.      Com a promulgação do Ato Institucional – 5, em dezembro de 1968, Abdias, alvo de vários Inquéritos Policiais-Militares, se viu impedido de retornar ao país.  

“Esse infortúnio foi um obstáculo para o retorno de Abdias ao Brasil. Limitou as atividades do Museu de Arte Negra, mas não as do artista, que continuou produzindo e coletando obras durante o seu exílio”, comenta Elisa Larkin Nascimento, viúva de Abdias Nascimento e co-fundadora do IPEAFRO. “Assim, atualmente uma profusão de artistas nacionais e internacionais integram o acervo do MAN-IPEAFRO, contribuindo para o enriquecimento das narrativas curatoriais sobre a produção artística negra”, finaliza.  

Matérias publicadas sobre o lançamento

TVs
Jornais
Sites
Rádios

Serviço: 
Museu de Arte Negra – Primeiro ato: Abdias Nascimento e Tunga 
Abertura: sábado, 4 de dezembro de 2021
Local: Galeria Mata | Instituto Inhotim 

 
 

Exposição coletiva em Nova York traz Abdias Nascimento e o Teatro Experimental do Negro

IPEAFRO_AN_026 Abdias Nascimento, Frontal de um Templo. Acrílico sobre tela, 102 x 153 cm. Búfalo, EUA, 1972

Exposição: Escrito no corpo. 
Curadoria: Keyna Eleison e Victor Gorgulho.
Local: Tanya Bonakdar Gallery, Nova York/EUA.
Data: 25 Junho — 30 Julho, 2021. 

A exposição coletiva “Escrito no Corpo”, realizada por Tanya Bonakdar Gallery e Fortes D’Aloia & Gabriel, na Tanya Bonakdar Gallery, em Nova Iorque, é um desdobramento da pesquisa realizada para a mostra homônima ocorrida na Carpintaria, Rio de Janeiro, em 2020.

A exposição inclui obras de Abdias Nascimento, Agrippina R. Manhattan, Antonio Tarsis, Ayrson Heráclito, Carla Santana, Davi Pontes & Wallace Ferreira, Diambe, Dona Cici, Efrain Almeida, Herbert de Paz, Marcia Falcão, Melissa de Oliveira, Moisés Patrício, Panmela Castro, Paulo Nazareth, Rodrigo Cass e Sonia Gomes.

A curadoria costura as produções de jovens e consagrados artistas brasileiros com o acervo fotográfico do Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado e dirigido por Abdias Nascimento (1914-2011), figura fundamental do pensamento negro no país. “Escrito no Corpo” apresenta parte do acervo fotográfico do TEN como marco e ponto de partida para a discussão de questões relacionadas à raça, identidade e corpo.

Como parte dos preparativos da exposição, Elisa Larkin Nascimento, diretora do IPEAFRO,  participou de uma conversa sobre o Teatro Experimental do Negro e Abdias do Nascimento.
Assista: https://vimeo.com/546575419 

IPEAFRO_AN_072 Abdias Nascimento, Composição n. 1. Acrílico sobre tela, 91 x 61 cm. Búfalo, EUA, 1971

Em uma época em que experiências de injustiça e racismo sistêmico se tornaram áreas cada vez mais urgentes de investigação cultural, esta exposição estabelece um diálogo entre as histórias de raça e representação em ambos os países, enfatizando as especificidades e circunstâncias que tanto as aproximam quanto as diferem do legado multidisciplinar de Abdias  Nascimento,

O legado multidisciplinar de Abdias Nascimento, que se desenrolou nos campo da arte, do ativismo social e político e do meio acadêmico, torna-se evidente na mostra também pela exibição de duas de suas pinturas — Composição n. 1 e Frontal de um templo —, datadas do início da década de 1970 e produzidas em território norte-americano.

Em 1968, quando a ditadura militar esteve em curso no País, o artista viaja aos Estados Unidos — apoiado pela Fundação Fairfield — com o objetivo de realizar um intercâmbio entre os movimentos norte-americano e brasileiro na promoção da cultura e dos direitos civis da população negra. O fechamento do Congresso e a suspensão dos direitos civis e políticos da oposição ao regime impediram o retorno do artista, que ficou exilado nos Estados Unidos. Ele atuou em universidades como a Yale e a Wesleyan, e torna-se professor titular da Universidade do Estado de Nova York em Buffalo, EUA. Aprofundou e desenvolveu sua produção artística na pintura. Para Abdias, a representação visual de signos e divindades ligadas às religiões afrobrasileiras se mostra um poderoso instrumento de comunicação não apenas com seu entorno, em um plano terrestre, como também com realidades extrafísicas, planos espirituais. Abdias retorna ao Brasil somente em 1981.

Abdias Nascimento fundou o Teatro Experimental do Negro (TEN) no Rio de Janeiro em 1944, com o propósito central de reivindicar espaço para pessoas negras no teatro da época. A estratégia inicial de apropriação do teatro como espaço de poder, revela-se um tanto mais tentacular e amplia-se em novas frentes de articulação. O TEN foi pioneiro em organizar, por exemplo, cursos de alfabetização, frentes trabalhistas e até concursos de beleza que enalteciam a cultura negra em uma sociedade profundamente racista, apesar de ainda pautada pelo mito da “democracia racial”.

As atividades do TEN encerraram-se em 1961, mas o pensamento de Abdias continuou a ecoar nas décadas seguintes e até hoje. Escrito no corpo toma como ponto de partida parte do acervo fotográfico do TEN para discutir questões ligadas à raça, identidade e corpo. A dimensão narrativa do corpo aparece em vários trabalhos da mostra, especialmente nas foto-performances de Antonio Tarsis, Ayrson Heráclito e Carla Santana. Através de diferentes abordagens, suas obras partilham a ideia de uma escrita de si através do ato performativo.

A fotografia de Melissa de Oliveira, por sua vez, caminha em via oposta ao arquitetar um olhar sobre o outro, entendendo a fotografia como exercício de alteridade e construção de subjetividade em retratos realizados no Morro do Dendê, um complexo de comunidades na periferia do Rio de Janeiro, onde nasceu e vive. Obras em vídeo também servem de suporte para gestos performáticos, seja na busca por seu próprio reflexo empreendida por Rodrigo Cass em Narciso no mijo, ou na documentação da ação Devolta, de Diambe, em que a artista coreografa um círculo de fogo ao redor do monumento público em homenagem à princesa Isabel, figura da família imperial brasileira responsável pela assinatura da Lei Áurea, que aboliu a escravidão no país, em 1888 — 23 anos depois dos Estados Unidos. Se a atitude de Isabel foi digna de homenagem em praça pública, no Rio de Janeiro, seu papel histórico é, há muito questionado como apenas um gesto ilustrativo que não oferecia perspectiva para o modelo escravagista no país, à época. Já o filme de Davi Pontes & Wallace Ferreira reflete sobre a racialidade e flerta com a física quântica em uma performance que se instaura em um território híbrido entre a dança e a autodefesa.

A problematização em torno do imaginário colonial também aparece na obra de Herbert de Paz, em que o artista preenche a silhueta de uma figura indígena com imagens retiradas da revista História do Brasil, editada há décadas pela Biblioteca Nacional, perpetuando uma narrativa histórica forjada no seio do colonialismo. As esculturas de Paulo Nazareth reafirmam a negação da lógica colonial e imperialista.

O corpo enquanto narrativa encarnada reaparece nas pinturas de Márcia Falcão, Moisés Patrício e Panmela Castro. Ao passo em que as obras de Falcão usam o corpo feminino como significante de violência e também de liberdade nas esferas público e privada, as pinturas de Castro são retratos de pessoas próximas à artista que se dispuseram a posar à noite, em vigília comum, durante a pandemia do Covid 19. Os personagens das telas de Patrício, por sua vez, incorporam a ancestralidade do candomblé, uma das vertentes da religiosidade afro-diaspórica mais fortes no Brasil.

A relação entre a representação do corpo e a religiosidade é temática frequente também na produção de Efrain Almeida, cujas esculturas de madeira e bronze compreendem o imaginário popular do Nordeste do Brasil, onde o artista nasceu. O interesse por materiais cotidianos marca o fazer escultórico de Sonia Gomes, cuja gaiola envolta por pedaços de tecidos torcidos sugere a liberdade almejada pela frase de autoria de Agrippina R. Manhattan, em sua obra de led: Antes de caírmos, nos tornaremos o sol.

Agradecimento especial à Elisa Larkin Nascimento e ao IPEAFRO (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros).

Tanya Bonakdar Gallery
521 West 21st Street
New York, NY 10011

Texto: divulgação

9 EDITAIS ABERTOS PARA PROJETOS NO CONTEXTO DE PANDEMIA

Fique ligado nas chamadas, editais e prêmios por ocasião da pandemia do Covid-19. Separamos 9 oportunidades para você! Compartilhe essa ideia!

https://salvecriadores.com.br/
ATÉ 28/04
9 MIL REAIS
Produtores(as) de vídeo das periferias de São Paulo, temos um convite para vocês! O #SalveCriadores é uma iniciativa que, a partir do apoio a coletivos e criadores de conteúdo das periferias de São Paulo, vai trazer reflexões e dados sobre a crise do COVID-19 e seus reflexos nas populações indígenas, negras e periféricas. A proposta é reforçar o importante trabalho que vem sendo feito por criadores de conteúdo e trazer pontos de vista e perspectivas que ainda não foram levantados.

https://maratonacultural.wixsite.com/maratona/inscricoes
ATE 30/04/2020
VALOR DEFINIDO POR PROJETO
Estão abertas as inscrições para a Maratona Cultural de Florianópolis, evento multicultural que atua na promoção de uma comunicação direta entre cultura, arte, entretenimento e o turismo, produzido pelo Instituto Maratona Cultural. O objetivo da chamada é selecionar trabalhos  de  arte  e  cultura em  quaisquer expressões artísticas  e/ou  intelectuais,  apresentados  e/ou  desenvolvidos  em  quaisquer tipos de suporte, formato e área artística para compor a Maratona, que será realizada entre os dias 14 e 16 de agosto de 2020.

ppc.petrobras.com.br/artes-cenicas-criancas/inscrições
ATÉ 30/04/2020
3 MILHÕES DE REAIS DIVIDIDOS ENTRE OS PROJETOS VENCEDORES
Já a Petrobras Cultural está com seleção de projetos de dança, teatro e circo voltados para crianças de até seis anos. As inscrições dever ser feitas até 30 de abril pelo ppc.petrobras.com.br/artes-cenicas-criancas/inscrições. Serão aceitos projetos de espetáculos (inéditos ou de repertório); atividades em locais inusitados; novas narrativas e formatos. Segundo a Petrobras, a chamada tem a verba total de R$ 3 milhões. Conforme o edital, não há um valor máximo definido por projeto, no entanto a quantia deve ser compatível com os limites da Lei Federal de Incentivo à Cultura. O edital exige que os projetos contemplem apresentações em cidades com menos de 150 mil habitantes e, pelo menos, uma capital nas regiões Norte, Nordeste ou Centro Oeste.

https://comunidadepresente.itausocial.org.br/
ATÉ 08/05/2020
Nesta edição emergencial, o programa tem como foco apoiar famílias em situação de vulnerabilidade para amenizar os impactos causados pelo avanço do Covid-19. PARA OSCs. O programa Comunidade, presente! – Edição Emergencial Covid-19 (“Comunidade, presente! Emergencial”) é uma iniciativa da Fundação Itaú para a Educação e Cultura (“Itaú Social”), cujo objetivo é, durante a pandemia da Covid-19, apoiar as comunidades em situação de vulnerabilidade (“Famílias”), que estão sofrendo privações decorrentes dos impactos econômicos gerados pela quarentena. O programa acessará as famílias por intermédio das Organizações da Sociedade Civil e Associações de Pais e Mestres de Escolas Públicas (doravante denominadas “OSCs”) que atuam no campo da educação e atendem crianças, adolescentes e jovens. Os recursos doados pelo Itaú Social às OSCs serão destinados à aquisição de itens essenciais de consumo das Famílias, como alimentos, produtos de higiene e gás de cozinha (“Cestas”).

https://benfeitoria.com/canal/enfrente
INSCRIÇÕES IMEDIATAS
ATÉ 30MIL I
Estão abertas as inscrições para o Matchfunding Enfrente o Corona, plataforma de financiamento de iniciativas de enfrentamento dos efeitos do Coronavírus nas periferias brasileiras, idealizada pela Fundação Tide Setubal, em parceria com a Benfeitoria. Serão contempladas iniciativas que atuem no enfrentamento dos efeitos do coronavírus nas periferias urbanas ou em áreas de outros contextos periféricos urbanos em todo o Brasil. Podem participar coletivos, pessoas físicas, pessoas jurídicas de direito privado (com ou sem fins lucrativos) que tenham sido idealizadas e/ou sejam lideradas por pessoas que tenham nascido e/ou vivido em periferias urbanas brasileiras e/ou em outras áreas urbanas em contexto periférico.

https://www.institutobanese.org.br/editaldagente/static/media/edital-quarentena-da-gente.647f9e91.pdf
ATÉ 08/05/2020
1.000 MIL REAIS POR PROJETO
Constitui-se objeto deste chamamento público selecionar projetos de artistas sergipanos ou residentes em Sergipe. Essa seleção contempla vídeos inéditos em diversas linguagens artísticas: música, teatro, circo, dança, artes visuais, literatura (leitura, contação de história, recitação), audiovisual, artes integradas e expressões culturais populares. Os projetos deverão ser apresentados em formato de vídeo, com duração de até 15 minutos. Serão selecionadas 70 (setenta) propostas, que receberão o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), cada.

https://benfeitoria2.typeform.com/to/P6m0Ud
ATÉ 10/05 E ATÉ 10/07
ATÉ 4 MILHÕES DE REAIS DIVIDIDOS POR PROJETO
Matchfunding BNDES+ Patrimônio Cultural. Com R$ 4 milhões, o Matchfunding BNDES+ é um programa inovador de financiamento a projetos culturais. O projeto é o primeiro do setor público a adotar um modelo de financiamento combinado, unindo o aporte direto do BNDES ao financiamento coletivo (crowdfunding). A cada R$ 1 doado, o BNDES aporta R$ 2, observando o valor máximo de R$ 200 mil para cada projeto. Para receber os recursos efetivamente, as iniciativas deverão atingir suas metas de arrecadação, que serão informadas ao público. Além disso, só serão apoiadas as ações que apresentarem um determinado índice mínimo de pulverização de recursos. A ideia, com isso, é que sejam efetivamente realizados os projetos que contem com amplo engajamento do público.
https://premio-select.com.br
ATÉ 30/06/2020
20 mil reais para vencedor
O Prêmio seLecT de Arte e Educação foi criado para valorizar e incentivar escolas, instituições de arte, espaços de ensino, grupos de estudo, projetos artísticos colaborativos e iniciativas inovadoras e experimentais que favoreçam os diálogos e os vínculos entre arte e educação. Serão concedidos dois prêmios de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para as categorias Artista e Formador, para projetos realizados em todo o território nacional no biênio 2018/2019, e um prêmio para a nova categoria Camisa Educação.

https://solve.mit.edu/challenges/health-security-pandemics
ATÉ 18 DE JULHO
10 MIL DOLARES
Mediante a crise da pandemia do coronavírus, o MIT Solve lançou um desafio global para  estimular empreendedores, empresas, organizações sem fins lucrativos, pesquisadores acadêmicos e até mesmo pessoas físicas de forma individual a apresentem novas soluções em segurança da saúde. As iniciativas vencedoras terão acesso a um fundo para financiamento dos projetos, além de orientação e aceleração.

O peso simbólico do 14 de março

*Por Julio Menezes Silva 

Hoje é dia de reverenciar três ancestrais e independentemente de quem você seja, caro leitor, e de quais são as suas orientações individuais, atente-se para o simbolismo da data do 14 de março. Explico: nasceram em 1914 Carolina Maria de Jesus, escritora, e Abdias Nascimento, professor, artista plástico e político oficialmente indicado ao Nobel da Paz. Morreram a vereadora Marielle Franco e o seu motorista Anderson Gomes, em 2018, assassinados a mando de quem a polícia não sabe e o Estado brasileiro não quer descobrir. Por lei estadual no Rio de Janeiro, o dia 14 de março é Dia do Ativista pelo aniversário de Abdias, e Dia Marielle Franco de Luta contra o Genocídio das Mulheres Negras. Essas personalidades dedicaram a vida a resistir ao racismo brasileiro, o denunciaram ao mundo e deixaram mais evidentes o genocídio das populações negras.

Mas de que genocídio estamos falando? “O uso de medidas deliberantes e sistemáticas (morte, injúria corporal e mental, impossíveis condições de vida, prevenção de nascimentos), calculadas para o extermínio de um grupo racial, político ou cultural ou para destruir a língua, a religião ou a cultura de um grupo”. Essa definição está nas primeiras páginas do livro “O genocídio do Negro Brasieliro”, de Abdias Nascimento. Podemos afirmar que cada um deles – Carolina, Abdias e Marielle – foi atingido por diferentes facetas desse genocídio ao longo de suas vidas. Pagaram caro. Marielle levou quatro tiros na cabeça. Carolina morreu no ostracismo. Abdias não conseguiu uma sede para abrigar seu ambicioso projeto do Museu de Arte Negra (MAN). Mas no final das contas eles eram sementes e nós somos os seus frutos.

Se um dia o Brasil se livrar do racismo, certamente foi porque no caminho dessa construção houve um investimento pesado em educação de qualidade, desenvolvimento de pensamento crítico e ampliação do esforço de contar a história que a história não conta. Nós, negros e negras, somos responsáveis por reivindicar essa história, contar para os nossos filhos, pavimentar esse conhecimento para o futuro. “Nunca é tarde para voltar ao passado e apanhar o que ficou para trás” é o significado do provérbio Sankofa – cuja a imagem simboliza uma ave que olha para o próprio rabo. Outra interpretação possível para esse ideograma que compõe o conjunto de símbolos Adinkra, linguagem escrita dos povos Acã, é aprender com o passado, compreender o presente para construir o futuro. Eis aqui uma pequena colaboração para esse possível futuro e desejado.

Imagem criada pelo designer Luiz Carlos Gá para o evento que homenageou Carolina, Abdias e Marielle no 14 de março de 2019, no Centro de Artes da Maré, na favela Nova Holanda, Rio de Janeiro (RJ)

Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977)

Escritora mineira, nascida em Sacramento (MG) em 14 de março de 1914. Após um episódio de racismo em sua cidade, no qual foi acusada injustamente de roubo e espancada até que o dinheiro aparecesse para que ela pudesse ser inocentada, mudou-se para São Paulo – onde chegou caminhado a pé. Estabeleceu-se na favela do Canindé as margens da marginal do Tietê. Teve três filhos. Cuidou deles sozinha, sem a presença paterna. A fome fazia parte do cotidiano de sua família. Catando papéis tirava o mínimo para o sustento. Dos papéis também vinham os pedaços de folha onde escrevia suas memórias, textos, poesias e seus sonhos. Um dia, o jornalista Audálio Dantas foi fazer uma matéria para a Folha de São Paulo sobre a vida na favela. Encontrou-se com Carolina Maria de Jesus, soube de sua história, leu seus textos. Publicou sua história no jornal. Dois anos mais tarde, em 1960, seus textos foram reunidos em Quarto do Despejo, livro que virou best-seller. Está hoje em 16 países, 46 idiomas. Vendeu quatro milhões de livros no exterior, 3 milhões no Brasil. É a mulher brasileira que foi mais publicada no mundo. Foi confrontada pelo stabilishment e o seu racismo estrutural. Carolina tronou-se uma referência de um “lugar de fala”, termo tão usado nos dias de hoje. Afinal Carolina não deixava que ninguém falar por ela. Morreu no ostracismo em 1977.

Marielle Franco (1979 – 2018)

Marielle Franco foi uma política brasileira. Formada em Sociologia (pela PUC-Rio) e com Mestrado em Administração Pública (pela UFF). Eleita Vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) no ano de 2016, com 46.502 votos. Enfrentou as milícias sem medo. Denunciou policiais corruptos. Defensora dos direitos humanos, coordenou, junto com Marcelo Freixo, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Ao longo do período em que atuou como vereadora apresentou 16 projetos de lei, especialmente pensados em políticas públicas para negros, mulheres e LGBTI. Mãe, mulher negra de favela, mãe, lésbica. Foi assassinada ao lado de seu motorista Anderson Gomes em um 14 de março, em crime ainda não desvendado. O caso talvez seja o mais relevante atualmente para se compreender o contexto da política nacional e de como funcionam os mecanismos de racismo no Brasil.

Abdias Nascimento (1914 – 2011)

Político, escritor, jornalista, teatrólogo, professor. Nasceu em Franca (SP). Fundador do Teatro Experimental do Negro, quando os negros e negras pisaram no palco do Teatro Municipal do Rio de Janeiro pela primeira vez, dirigindo, atuando e produzido uma peça e o protagonizando o papel principal. Ajudou a organizar o primeiro Congresso do Negro Brasileiro. Fundou o jornal Quilombo. Foi curador do projeto do Museu de Arte Negra. Foi perseguido politicamente e preso diversas vezes em sua vida por resistir ao racismo. Viveu 13 anos em exílio durante a Ditadura Militar no Brasil. Voltou ao País e foi o primeiro parlamentar negro da Câmara dos Deputados. Fundou o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Participou da promulgação da Constituição Brasileira em 1988. Defensor da democracia e dos Direitos Humanos das populações negras, foi oficialmente indicado ao Nobel da Paz. Autor de “O Genocídio do Negro Brasileiro”e “O Quilombismo”, clássicos do pensamento social brasileiro. Foi secretário de Estado, Senador da República. Morreu aos 97 anos e é considerado uma das grandes personalidades brasileiras do século XX

UM RELATO PESSOAL

Revistando algumas anotações pessoais que mantenho em diários, cheguei ao dia 14 de março de 2018. Eis aqui alguns dos apontamentos registrados naquele dia.

“São 5h53 da manhã… No Fórum Social Mundial, observo, milhares de pessoas afinadas com o “mundo melhor é possível”. Neste hotel, que fica ao lado do Instituto Goethe de Salvador, vários turistas nacionais e internacionais dividem espaço. Aqui no looby, antes das seis, já há uma movimentação. Fico pensando no longo dia que terei pela frente e de que maneira posso contribuir para um mundo melhor. Acho que o melhor caminho a tal passa por mim, pelo autoconhecimento. Talvez me conhecendo melhor, melhor de mim posso oferecer ao mundo: dons, talentos, amor, compaixão. O que mais este mundo precisa?

Foi com esse espírito de esperança que me lancei naquele 14 de março de 2018. Com fé na humanidade, meditando e escrevendo – em um ato de prazer e fé.

“Animados, enquanto os hospedes tomam café, estão os funcionários do hotel, conversando com o sotaque inconfundível dessa terra, com sorrisos pouco comum para este horário, e um bom-humor inconcebível, pelo menos para mim, aquela hora do dia. E acredito que esta turma não deve ter levantado da cama antes das quatro da manhã, como é comum em nosso país, principalmente para os trabalhadores que moram afastados dos grandes centros. Que a luz e o bom humor norteiem o dia de hoje, e que eu possa ter uma noite de sono um pouco melhor do que a que tive – tivemos – hoje. Que seja assim!

Fechei o caderno. Tomei café da manhã com a professora Elisa Larkin Nascimento e o escritor Milsoul Santos. Saímos para o Teatro Martim Gonçalves, da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros (IPEAFRO) e parceiros realizariam o primeiro de uma série de três eventos em torno do lançamento da nova edição do livro “O Genocídio do Negro Brasileiro”, de Abdias Nascimento. Poesia, música, pensamento crítico, esperança. O teatro pulsava, foi lindo. À tarde visitei a UFBA / Ondina que pulsava ainda mais: gente de várias partes do mundo, diferentes culturas, era o povo na rua cantando como uma reza, um ritual.   

À noite, chegou a notícia da morte de Marielle. Eu já estava deitado, preparando-me para dormir. Pensei: “fudeu!”. Permaneci estático. A única reação possível foi escrever no diário. E lá está:  

“Como é habitar um corpo afro-brasileiro que por destino “caiu” na cidade do Rio de Janeiro, que por destino chegou até aqui? O que me motiva a escrever é este turbilhão de acontecimentos simultâneos que fazem parte de nossa vida… A morte da vereadora Marielle Franco, do Psol, assassinada em circunstâncias ainda duvidosas… Eu votei nela nas últimas eleições. Mulher negra, jovem. Parecia para mim séria e honesta. Hoje sei de seu assassinato, no Estácio, bairro onde nasceu o samba. Eu fico indignado com a violência na cidade, apesar de já ter me “acostumado” a essa realidade no Rio.

De salvador, onde passei o dia em compromissos dentro do âmbito do Fórum Social Mundial 2018, que propõe “um mundo melhor é possível”, discutimos, agimos, poetizamos, criamos atividades em torno do “Genocídio do Negro Brasileiro”, livro de Abdias. As discussões giravam em torno justamente do genocídio ser além da morte física, mas esta quando chega, é fatal. Literalmente nos faz perder a esperança de tudo.

Eis que surge o Flamengo, com dois gols de jovem negro, de São Gonçalo, o pior IDH do Rio, um dos piores do Brasil, que faz dois gols contra o Emelec, fora de casa pela Libertadores. Aí compreendo a plenitude da vida: indignação, revolta, felicidade, amor, tristeza, raiva. Tudo isso habita esse corpo negro enquanto escrevo estas palavras, à meia noite, sentado em uma privada de hotel, com a porta (do banheiro) fechada para não incomodar a minha companheira que já está no décimo sono. A vida é meio sei lá, bicho. Eu só peço a Deus que me livre do mal. Amém!”.

O resto é história. 

Viva o 14 de março! Que a data seja celebrada pelo protagonismo dessas personalidades e de outras tantas que fazem a diferença, em vida, para um mundo melhor. Queremos mais Carolinas, mais Nascimentos. Queremos #justiçapormarielle! A pergunta que fica é: quem mandou matar Marielle? 

*Julio Menezes Silva é jornalista, artista em formação. É coordenador de Comunicação do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO) e integrante do Fórum Permanente Pela Igualdade Racial.

O peso simbólico do 14 de março

*Por Julio Menezes Silva (IPEAFRO/ FOPIR)

Hoje é dia de reverenciar três ancestrais e independentemente de quem você seja, caro leitor, e de quais são as suas orientações individuais, atente-se para o simbolismo da data do 14 de março. Explico: nasceram em 1914 Carolina Maria de Jesus, escritora, e Abdias Nascimento, professor, artista plástico e político oficialmente indicado ao Nobel da Paz. Morreram a vereadora Marielle Franco e o seu motorista Anderson Gomes, em 2018, assassinados a mando de quem a polícia não sabe e o Estado brasileiro não quer descobrir. Por lei estadual no Rio de Janeiro, o dia 14 de março é Dia do Ativista pelo aniversário de Abdias, e Dia Marielle Franco de Luta contra o Genocídio das Mulheres Negras. Essas personalidades dedicaram a vida a resistir ao racismo brasileiro, o denunciaram ao mundo e deixaram mais evidentes o genocídio das populações negras.

Mas de que genocídio estamos falando? “O uso de medidas deliberantes e sistemáticas (morte, injúria corporal e mental, impossíveis condições de vida, prevenção de nascimentos), calculadas para o extermínio de um grupo racial, político ou cultural ou para destruir a língua, a religião ou a cultura de um grupo”. Essa definição está nas primeiras páginas do livro “O genocídio do Negro Brasieliro”, de Abdias Nascimento. Podemos afirmar que cada um deles – Carolina, Abdias e Marielle – foi atingido por diferentes facetas desse genocídio ao longo de suas vidas. Pagaram caro. Marielle levou quatro tiros na cabeça. Carolina morreu no ostracismo. Abdias não conseguiu uma sede para abrigar seu ambicioso projeto do Museu de Arte Negra (MAN). Mas no final das contas eles eram sementes e nós somos os seus frutos.

Se um dia o Brasil se livrar do racismo, certamente foi porque no caminho dessa construção houve um investimento pesado em educação de qualidade, desenvolvimento de pensamento crítico e ampliação do esforço de contar a história que a história não conta. Nós, negros e negras, somos responsáveis por reivindicar essa história, contar para os nossos filhos, pavimentar esse conhecimento para o futuro. “Nunca é tarde para voltar ao passado e apanhar o que ficou para trás” é o significado do provérbio Sankofa – cuja a imagem simboliza uma ave que olha para o próprio rabo. Outra interpretação possível para esse ideograma que compõe o conjunto de símbolos Adinkra, linguagem escrita dos povos Acã, é aprender com o passado, compreender o presente para construir o futuro. Eis aqui uma pequena colaboração para esse possível futuro e desejado.

Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977)

Escritora mineira, nascida em Sacramento (MG) em 14 de março de 1914. Após um episódio de racismo em sua cidade, no qual foi acusada injustamente de roubo e espancada até que o dinheiro aparecesse para que ela pudesse ser inocentada, mudou-se para São Paulo – onde chegou caminhado a pé. Estabeleceu-se na favela do Canindé as margens da marginal do Tietê. Teve três filhos. Cuidou deles sozinha, sem a presença paterna. A fome fazia parte do cotidiano de sua família. Catando papéis tirava o mínimo para o sustento. Dos papéis também vinham os pedaços de folha onde escrevia suas memórias, textos, poesias e seus sonhos. Um dia, o jornalista Audálio Dantas foi fazer uma matéria para a Folha de São Paulo sobre a vida na favela. Encontrou-se com Carolina Maria de Jesus, soube de sua história, leu seus textos. Publicou sua história no jornal. Dois anos mais tarde, em 1960, seus textos foram reunidos em Quarto do Despejo, livro que virou best-seller. Está hoje em 16 países, 46 idiomas. Vendeu quatro milhões de livros no exterior, 3 milhões no Brasil. É a mulher brasileira que foi mais publicada no mundo. Foi confrontada pelo stabilishment e o seu racismo estrutural. Carolina tronou-se uma referência de um “lugar de fala”, termo tão usado nos dias de hoje. Afinal Carolina não deixava que ninguém falar por ela. Morreu no ostracismo em 1977.

Marielle Franco (1979 – 2018)

Marielle Franco foi uma política brasileira. Formada em Sociologia (pela PUC-Rio) e com Mestrado em Administração Pública (pela UFF). Eleita Vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) no ano de 2016, com 46.502 votos. Enfrentou as milícias sem medo. Denunciou policiais corruptos. Defensora dos direitos humanos, coordenou, junto com Marcelo Freixo, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Ao longo do período em que atuou como vereadora apresentou 16 projetos de lei, especialmente pensados em políticas públicas para negros, mulheres e LGBTI. Mãe, mulher negra de favela, mãe, lésbica. Foi assassinada ao lado de seu motorista Anderson Gomes em um 14 de março, em crime ainda não desvendado. O caso talvez seja o mais relevante atualmente para se compreender o contexto da política nacional e de como funcionam os mecanismos de racismo no Brasil.

Abdias Nascimento (1914 – 2011)

Político, escritor, jornalista, teatrólogo, professor. Nasceu em Franca (SP). Fundador do Teatro Experimental do Negro, quando os negros e negras pisaram no palco do Teatro Municipal do Rio de Janeiro pela primeira vez, dirigindo, atuando e produzido uma peça e o protagonizando o papel principal. Ajudou a organizar o primeiro Congresso do Negro Brasileiro. Fundou o jornal Quilombo. Foi curador do projeto do Museu de Arte Negra. Foi perseguido politicamente e preso diversas vezes em sua vida por resistir ao racismo. Viveu 13 anos em exílio durante a Ditadura Militar no Brasil. Voltou ao País e foi o primeiro parlamentar negro da Câmara dos Deputados. Fundou o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Participou da promulgação da Constituição Brasileira em 1988. Defensor da democracia e dos Direitos Humanos das populações negras, foi oficialmente indicado ao Nobel da Paz. Autor de “O Genocídio do Negro Brasileiro”e “O Quilombismo”, clássicos do pensamento social brasileiro. Foi secretário de Estado, Senador da República. Morreu aos 97 anos e é considerado uma das grandes personalidades brasileiras do século XX

UM RELATO PESSOAL

Revistando algumas anotações pessoais que mantenho em diários, cheguei ao dia 14 de março de 2018. Eis aqui alguns dos apontamentos registrados naquele dia.

“São 5h53 da manhã… No Fórum Social Mundial, observo, milhares de pessoas afinadas com o “mundo melhor é possível”. Neste hotel, que fica ao lado do Instituto Goethe de Salvador, vários turistas nacionais e internacionais dividem espaço. Aqui no looby, antes das seis, já há uma movimentação. Fico pensando no longo dia que terei pela frente e de que maneira posso contribuir para um mundo melhor. Acho que o melhor caminho a tal passa por mim, pelo autoconhecimento. Talvez me conhecendo melhor, melhor de mim posso oferecer ao mundo: dons, talentos, amor, compaixão. O que mais este mundo precisa?

Foi com esse espírito de esperança que me lancei naquele 14 de março de 2018. Com fé na humanidade, meditando e escrevendo – em um ato de prazer e fé.

“Animados, enquanto os hospedes tomam café, estão os funcionários do hotel, conversando com o sotaque inconfundível dessa terra, com sorrisos pouco comum para este horário, e um bom-humor inconcebível, pelo menos para mim, aquela hora do dia. E acredito que esta turma não deve ter levantado da cama antes das quatro da manhã, como é comum em nosso país, principalmente para os trabalhadores que moram afastados dos grandes centros. Que a luz e o bom humor norteiem o dia de hoje, e que eu possa ter uma noite de sono um pouco melhor do que a que tive – tivemos – hoje. Que seja assim!

Fechei o caderno. Tomei café da manhã com a professora Elisa Larkin Nascimento e o escritor Milsoul Santos. Saímos para o Teatro Martim Gonçalves, da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros (IPEAFRO) e parceiros realizariam o primeiro de uma série de três eventos em torno do lançamento da nova edição do livro “O Genocídio do Negro Brasileiro”, de Abdias Nascimento. Poesia, música, pensamento crítico, esperança. O teatro pulsava, foi lindo. À tarde visitei a UFBA / Ondina que pulsava ainda mais: gente de várias partes do mundo, diferentes culturas, era o povo na rua cantando como uma reza, um ritual.   

À noite, chegou a notícia da morte de Marielle. Eu já estava deitado, preparando-me para dormir. Pensei: “fudeu!”. Permaneci estático. A única reação possível foi escrever no diário. E lá está:  

“Como é habitar um corpo afro-brasileiro que por destino “caiu” na cidade do Rio de Janeiro, que por destino chegou até aqui? O que me motiva a escrever é este turbilhão de acontecimentos simultâneos que fazem parte de nossa vida… A morte da vereadora Marielle Franco, do Psol, assassinada em circunstâncias ainda duvidosas… Eu votei nela nas últimas eleições. Mulher negra, jovem. Parecia para mim séria e honesta. Hoje sei de seu assassinato, no Estácio, bairro onde nasceu o samba. Eu fico indignado com a violência na cidade, apesar de já ter me “acostumado” a essa realidade no Rio.

De salvador, onde passei o dia em compromissos dentro do âmbito do Fórum Social Mundial 2018, que propõe “um mundo melhor é possível”, discutimos, agimos, poetizamos, criamos atividades em torno do “Genocídio do Negro Brasileiro”, livro de Abdias. As discussões giravam em torno justamente do genocídio ser além da morte física, mas esta quando chega, é fatal. Literalmente nos faz perder a esperança de tudo.

Eis que surge o Flamengo, com dois gols de jovem negro, de São Gonçalo, o pior IDH do Rio, um dos piores do Brasil, que faz dois gols contra o Emelec, fora de casa pela Libertadores. Aí compreendo a plenitude da vida: indignação, revolta, felicidade, amor, tristeza, raiva. Tudo isso habita esse corpo negro enquanto escrevo estas palavras, à meia noite, sentado em uma privada de hotel, com a porta (do banheiro) fechada para não incomodar a minha companheira que já está no décimo sono. A vida é meio sei lá, bicho. Eu só peço a Deus que me livre do mal. Amém!”.

O resto é história. 

Viva o 14 de março! Que a data seja celebrada pelo protagonismo dessas personalidades e de outras tantas que fazem a diferença, em vida, para um mundo melhor. Queremos mais Carolinas, mais Nascimentos. Queremos #justiçapormarielle! A pergunta que fica é: quem mandou matar Marielle? 

*Julio Menezes Silva é jornalista, artista em formação. É coordenador de Comunicação do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO) e integrante do Fórum Permanente Pela Igualdade Racial.